Sentia-se um corpo inerte à deriva no infinito, sujeito às
partidas cruéis do destino. Não que acreditasse no “destino”, julgava o próprio
conceito da palavra ridículo, como Homem que era gostava de ter o poder nas
suas mãos, ou pelo menos pensar que assim o era. No entanto, naquele momento sentia
a força do seu fado ligado, por sangue, ao filho da puta do velho…. Uma piada
cruel.
A carta de nada lhe tinha servido de consolação, muito pelo
contrário, tinha o deixado num estado impróprio seu. Ao fim, do que lhe
pareceu, cinco minutos, bateram-lhe à porta do quarto. Acordou.
Laivos de sol roubavam a escuridão. A carta do velho? Estava
intacta, mas não escondida, no monte onde a tinha deixado. Tudo tinha sido um
sonho, ou pesadelo. Já nem se lembrava do que tinha lido na carta mas não
interessava, qualquer palavra lida seria apenas a manifestação do seu, tão criativo,
inconsciente. Levou as mãos à cabeça, esperando encontrar alguma lucidez, na
porcaria de confusão que a sua vida se tinha tornado. Fez as malas rapidamente,
determinado a por um fim à tortura que a casa lhe causava e terminar, por fim,
com esse capítulo da sua vida, vestiu-se e fez check-out do hotel. Tirou um
cigarro do bolso e acendeu-o, compulsivamente, à medida que marcava o número da
prima no telemóvel, que atendeu prontamente.
“Preciso que me dê boleia.”
“Não tens dinheiro para um táxi agora, queres ver?” A prima
respondeu-lhe com ironia.
“Não pode dar boleia ao seu primo?”
“Boleia para onde? Não me digas…!”
“Sim, boleia para casa. A casa.” Repostou impacientemente. “Estou
à espera em frente ao Plaza. Pode passar aqui daqui a cinco minutos?”
“Mas… Tu queres boleia, agora?! Neste preciso momento?!”
Perguntou perplexa.
“Claro!”
“Há pessoas que trabalham, caro primo!!” – Replicou violentamente.
“6 minutos?” Gracejou.
“Amanhã!”
“Tem de ser hoje!”
“Porquê? Vais-te acobardar?” Riu-se, o que o deixou a ferver
de irritação.
“Um simples não basta! Eu arranjo-me, não se preocupe.”
Preparou-se para desligar a chamada.
“Lucas espera! Tem calma… Estou aí em 5 minutos.” Suspirou. “Posso
só perguntar, o que te levou a mudares de decisão tão rapidamente?”
“Só quero ver-me livre deste assunto o mais rápido possível,
nada mais.”
“Sim, claro!” Voltou a ser irónica. “ Como se os teus
secretários ou assistentes ou lá o que seja, não pudessem tratar do assunto?!”
“Nunca ouviu dizer?”
“O quê?”
“Se queres uma coisa bem feita, fá-la tu mesmo.”
“Sim, sim… não vou na tua treta.”