Acordou, em sobressalto, do que lhe pareceu um sono breve, confirmado pelo
persistente e incessante ronco do homem com o qual partilhava a parede do
quarto. O telemóvel tocava repetidamente. Tentou ignorá-lo, durante a
eternidade de tempo que permaneceu no escuro, tendo apenas por companhia os
barulhos do vizinho, uma companhia solitária e desagradável portanto. Mas, o
toque, propositadamente irritante, definido para se obrigar a si próprio a
atender chamadas invés de as rejeitar em toda a sua natureza anti-social,
tornou-se insuportável demais.
"É bom que isto seja urgente!! Duendes e potes de ouro no fim de
arco-íris esperam-me..." A ironia foi respondida com o mais frio dos
silêncios. "Estou sim...?" Insistiu. Por fim, uma voz rouca, baixa e
tremida fez-se ouvir. Reconheceu-a imediatamente.
"Desculpa... Des…" As palavras eram interrompidas por lágrima irrepressíveis.
Sentiu o mundo fechar sobre si mesmo, engoli-lo de uma forma tão completa que
sentia todo o corpo comprimir-se devido a uma força oculta. Esmagava-o,
afogava-o de uma maneira tal que não sentia o calor da superfície - a escuridão
era total. Não conseguia respirar, não tinha ar e, entre convulsões
incontroláveis, desabotoou a camisa que o sufocava. O temor tomou
conta de si, petrificou-o, não conseguia obrigar-se sequer a desligar o
telemóvel.
“Filho… Desculpa!” A voz do pai parecia-lhe fraca. “Ela veio ter comigo! A
culpa é dela!!! Mas, não penses que te podes esconder de mim!” Aos poucos, o
tom ameaçador que tanto o caracterizava, tomava conta do pai. “Vou-te sempre encontrar!
Sempre!!!”
Os olhos, involuntariamente, fecharam-se, todos os ruídos cessaram, deixou
até de sentir a roupa na pele. Isolou-se no vazio, consumido pelo terror.
“Lucas…?” Voltou à realidade. A voz era diferente, não a do seu pai.
“Maurício?” Uma enorme confusão fez-se evidente na sua mente. A voz que
ainda há pouco dava vida a todos os seus maiores medos, revelava-se nada mais
que uma ilusão, por muito realista que fosse. Tentou acalmar o coração, que
pulsava incontrolavelmente, e respirou fundo.
“Estás bem?” Maurício parecia preocupado. Apesar
de estar mais calmo, Lucas, não conseguia deixar de ofegar, o que, certamente, foi
percebido pelo astuto advogado.
“Sim, não te preocupes comigo.” Olhou para o despertador na mesa-de-cabeceira,
passavam poucos minutos das nove horas da manhã. Recorreu ao vício para o
acalmar, apesar de nunca ter apreciado fumar logo pela manhã. “Agora,” Deu uma
passa no cigarro e libertou o fumo violentamente “diz-me que tens boas notícias!”